...

Minha foto
allan de lana

sexta-feira, dezembro 31, 2004

Até daqui a um mês, mais ou menos. Boas festas. (...eu sobreviverei).

segunda-feira, dezembro 20, 2004

Estética Heimlich Transcendental
Obs.: este texto faz referência a uma parte específica da exposição do grupo "Eu, Você, Nós, Eles", que está acontecendo na CAL (Casa da Cultura da América Latina), no Setor Comercial Sul. Ao mesmo tempo é um convite, pois a exposição vai até o fim de janeiro de 2005.

Kant pós-freudiano? Caro leitor, isso não é deriva, mas uma um surto espaço-temporal. Surto eu. Surtara você ao ver o garfo do Matias Monteiro ou então ao querer usar seus óculos? Se sim, concordará em que há neles um estranhamento que acena, que quase se ergue como ameaça a realizar-se, quase torna seus objetos animados e duplicados.

O ato de ver não só transforma o visto, mas deve proteger o olho. Por isso, a ilusão nunca se realiza: ela aponta faminta para todas as nossas azeitonas, mas não pode fisgá-las. O limite, que é o sentido comum, o ver e conformar-se, é o que Freud atribuiu ao heimlich, familiar. Naqueles objetos siameses do Matias encenam-se quase além desses limites: nascimento e heimlich.

hum) nascimento: dois corpos nascidos não podem fundir-se, nascer é consolidar-se como organismo vivo, unidade, por isso, como para a Nazareth Pacheco, nossos corpos são emborrachados, têm pele, proteção contra a morte.

dois) heimlich: Freud mostra como na história do uso da expressão "heimlich" essa começou a assumir outro sentido, oposto do familiar, o que viria a originar o unheimlich: esse, estranho, aparece como algo oculto no familiar, ameaça que deverá ser encoberta.

* * * * *

A intuição transcendental ocorre sem objeto, ela se realiza no tempo e no espaço, que restam se supomos não haver mediações dos cinco sentidos.

hum) o tempo segundo Kant: é uma intuição "a priori" que estabelece sucessões nas quais um mesmo objeto está presente em seus vários momentos, sem, no entanto, perder sua unidade.

dois) O espaço segundo Kant: é uma intuição "a priori" na qual existem vários objetos que jamais se sobrepõem e só podem existir uma única vez, separados por suas distâncias.

* * * * *

Assim, espaço e tempo são indivisíveis e, neles, as coisas são unidades (espaço) e estabelecem relações internas, tensões, se movem (tempo). É no espaço e no tempo que as formas podem ser percebidas e que as coisas unas se dão aos sentidos do sujeito cartesiano. Mas aquele que vê e sente o que Matias apresenta quase rompe os próprios órgãos dos sentidos. Ao mesmo tempo que vê configurar-se uma aberração, o nascer de um duplo real, também pressente (caso considere absurda a primeira visão) a fusão mortífera. Impossível fugir do unheimlich.

Em lugar de tempo e espaço cartesianos como "intuições 'a priori'", esses aparecem como recalques: sua unidade reconforta a consciência da vida e da potência (reforçada pela unidade do sujeito), mas é mera proteção imaginária. O espaço sem recalques se confunde com o tempo. A expressão "espaço de tempo" é um ato falho da cultura, que indica nessa dubiedade seus prazeres e horrores ocultos por força da linguagem. Prazeres, sim, porque o duplo evoca relações narcísicas do eu.

* * * * *

Se o objeto dos sentidos (seja um garfo, um óculos ou um tênis) se oferece à sensibilidade duplamente, de modo absurdo e abusivo, há uma solução para senti-lo e outra para rejeitá-lo:

hum) a solução para negá-lo é o abrigo da cultura, dizê-lo absurdo para não causar vexame;

dois) a solução para senti-lo é oculta: duplicar também os sentidos, dobrar a sensibilidade kantiana e admitir, assim, o romper dos prazeres e das mortes.

Se aceitamos, secretamente, a segunda solução, duplicamos também, secretamente, os órgãos dos sentidos. Somos Narcisos monstruosos, receptivos a tudo. Surtamos espaço-temporalmente, admitimos o espaço como tempo-espaço. Surge em nós o corpo verdadeiro, que é o corpo erótico, onde ocorrem "a priori" todas as possibilidades. Não é mais um corpo desejante: para ele existe a fruição e o prazer da morte (sem pesares).

terça-feira, dezembro 07, 2004

Nunca falei de mim mesmo: tudo o que digo e escrevo sou eu (provisório). Não é egoísmo, mas talvez narcisismo por mim (ou por um "eu") esfacelado. Quantas interpretações para essa declaração? Que implicações isso tem? Antes de tudo, rejeitei às belas, eloqüentes e bem intencionadas verdades, fiquei sem princípios, mas não sei o suficiente sobre mim. Você sabe? Quase transcendo, como em momento de auto-esquartejamento espaço-temporal. Só posso aliviar a pressão não levando nada com seriedade, isso relaxa meus tendões, posterga o rompimento da última fibra solitária. Penso seriamente que vou a termo de propósito. Caso contrário, me viro contra-baixo e durmo essas cordas de som parco e sem sustento. É um ápice, um momento de silêncio, de suspensão.

segunda-feira, novembro 22, 2004

fragmento de um quarto


Como um diafrágma, vertia a ausência semelhante à descoberta, para um gozo de solidão.



quinta-feira, novembro 18, 2004

Extra!
a bienal depois de um mês e dois dias
Me perguntas: e a Bienal? Toda crítica a depreciou.
Algumas propostas de fato são descamadas ou perturbadas até a queda pelo ambiente conturbado, principalmente no térreo. Mas de início dois momentos me fizeram bem. Agrupei-os com o nome de "obras-descanso", pois seu primeiro impacto foi reter a turbulência e sugar meus sentidos para tateá-las. Laura Vinci e Jorge Macchi foram seus autores. Ambos utilizam materiais não-sólidos e que causam sensação de algo fluido: o som de caixinha de música (ar), em Macchi, o vapor d'água (ar e água) em Laura. A natureza nos dois são diferentes, porque em Macchi o som é associado à imagem de vídeo em loop de uma avenida larga vista de cima, com carros passando em diferentes velocidades, o que deixa o rastro de seu contexto original do cotidiano, que é crítico se estivermos em Sampa. A natureza de Laura deixa espaço maior para a potência do fenômeno natural em si, a evaporação e a condensação. Eles abrem grandes espaços para o gozo fora da experiência e a recombinação de Macchi provoca situação estranha, de desfamiliarização com algo muito conhecido e já carregado de significados, mas ele resiste, provoca como uma criança teimosa e não cai no reino comum dos significados.
Mas esses foram apenas os primeiros a me seduzir. Minha reação foi diferente com Batchelor, por exemplo (imagem acima)... E foram tantos outros...


blog temático
Alguns dos próximos meses serão temáticos. À direita está o tema para novembro. No fundo já são votos para 2005.

domingo, novembro 14, 2004

Com Barthes, por uma estética da dor.
"O estereótipo é a palavra repetida, fora de toda magia, de todo entusiasmo, como se fosse natural, como se por milagre essa palavra que retorna fosse a cada vez adequada por razões diferentes, como se imitar pudesse deixar de ser sentido como uma imitação (...) Nietzsche fez o reparo de que a 'verdade' não era outra coisa senão a solidificação de antigas metáforas (...) O estereótipo é esta nauseabunda impossibilidade de morrer".

sábado, novembro 06, 2004

Quem não foi à vernissage de ontem à noite não viu a infância das "Duas maneiras de furar a si mesmo". Os papéis se modificaram. O vento os torceu e a umidade da chuva invadiu a galeria. O lugar não é mais o mesmo. Convido-os para que assistam a essa metamorfose.

Breve comentário do Matias Monteiro
"A exposição de Allan de Lana na galeria de Bolso da Casa de Cultura da América Latina resiste a escrita. Ele constitui um espaço á parte; Allan nos lança irremediavelmente a um espaço outro, onde elementos flutuam em um desdobramento espacial que não se limita. A idéia dos furos e perfurações (já não recente nas pesquisas de Allan, mas só agora aberta ao público) não perde de vista a agressividade inerente no ato de perfurar, de vencer camadas, forçar caminhos e irromper superfícies. As pequenas inscrições pueris que Allan dispõe sobre as paredes revelam essa agressividade. Mas há também nelas muita suavidade. A perfuração neste trabalho se insere entre o ato violento de romper, e uma poética do não-limite, da não barreira, uma tentativa de igualar interior e exterior em um só espaço. A escolha de Allan pelos grafos infantis parece, neste aspecto, bem acertado. Não se trata de uma ingenuidade, mas de uma clara percepção da infância em si. O mundo também nos irrompe, nos adentra de forma violenta, ou na ambigüidade inerente a violência (furar o papel não com a ponta do prego, mas com sua outra extremidade umidecida). Disso advém uma possibilidade de amplitude.
Os pregos na parede sustentam com certa suavidade os textos e inscrições poéticas. O prego desconhece, ou conhece mas despreza, os limites físicos da sala. Ele quer ir além, ir através... O enxame de maribondos (são todos um nesse jogo de réplicas do coletivo) transfiguram-se em um só ataque, em uma só ferroada. Allan possivelmente não sabe, mas é discípulo inegável de Thanatus; seu furo aponta para uma possibilidade de equilíbrio de suspensão tencional, esse corpo perfurado é o corpo da não resistência, um corpo não mais tencionado, um corpo sem interior... um corpo que dessolve mediante a crueldade do furo, em total amplitude espacial".

segunda-feira, novembro 01, 2004

Voltei pra convidar vocês
Eu eu professor Vicente vamos abrir três exposições ao público dia 5/11, sexta-feira agora, 19:30h, na CAL - Casa da Cultura da América Latina.
A CAL fica no Setor Comercial Sul Quadra 04 - Ed. Anápolis, perto das Lojas Americanas.
Ocuparei a Galeria de Bolso com "Duas Maneiras de Furar a Si Mesmo". O resto é por conta do Vicente.

Duas Maneiras de Furar a Si Mesmo é composta por duas proposições inéditas. Uma são apropriações e pastiches de desenhos meus quando criança, outra é baseada em "Como furar papel-de-seda-azul-com-bolinha-branca", uma técnica sádica para realizar furos industriosos em papel.
Os desenhos infantis apropriados e imitados, o "Como furar papel-azul-com-bolinha-branca" e uma série que não é inédita, de desenhos sobre insetos, estarão expostos na Galeria de Bolso da CAL - Casa de Cultura da América Latina - a partir de 6/11/2004. A abertura da exposição acontece na noite dessa sexta-feira, 5/11.

sexta-feira, outubro 15, 2004

reclamações, ora bolas
Só o metrô salva. O ônibus faltará.

quarta-feira, outubro 13, 2004

Nunca vi Derrida antes que ele morresse.
Ele enfartou no Viaduto do Chá
Caiu no Teatro Municipal.
Rastejou até a Avenida das Quitandas
Quis tomar um mokaccino
Mas já estava louco o suficiente
Quase satisfeito.
A palavra o fez quedar o resto.


sexta-feira, setembro 24, 2004

A partir de hoje teremos mais imagens. Espero que o fato de boa parte delas ser fotografia, entretanto, não as façam bonitas e burras, nem feias e inteligentes. A primeira é bonitinha, bem executada, depois editada, pra ficar mais babaca ainda. Veja como ela é patética, veja como a beleza pode ser horroroza e como não cabe nesse espaço aqui, do eaudeparfum, nem em outro espaço nosso, íntimo. Por isso a publico: gosto de coisas feias, principalmente quando desacatam autoritarismos por si mesmas. Chacotas!: esse é um olhar pra fora, um olhar inconveniente. Adiante voltaremos à nossa leveza, uma ventania de quem tem pesos insuportáveis em suas cabeças-cheias, e que por isso sabe ter momentos de deleite a dois (ou mais).




Tratada de outra maneira, esvaziada da beleza e da harmonia, essa é a imagem de um templo, onde a meditação é usada para, justamente, harmonizar, expandir-se no espaço azul ou branco, vazio. Mas, nesse vazio tão cheio de sentido que se torna agressivo dependendo do blog que o expõe, algo há de ser notado: a mediação. O teto busca a imensidão onde, supostamente, moram espíritos. Mas atrás de um muro preto mora São Francisco, dando de comer aos pássaros. Joões de barro, suas moradas tão singelas, arrebatando de revés as alturas gloriosas de templos com frisos extendidos até as nuvens, são tanto quanto a lembrança pelos sentidos, nada mais, tudo o que se procura sem êxito noutro paraíso. A Beleza com "B" maiúsculo não é terrena.

sábado, setembro 18, 2004

Senhoras, não eduquem seus filhos.

domingo, setembro 05, 2004

Merz
Conhecer o merz é simples e importante. Ele é uma negação sarcástica da razão utilitária.

Como a dialética de Hegel, na denúncia de Michael Peters, composta por negações que constroem a afirmação segundo um princípio de diferença, pode-se pensar o merz em termos do que não é. Peças cheias de "styling" feitas com sucata e ferro velho não o são. Elas podem captar o sentido mercantilista da reciclagem, o mesmo buscado por marqueteiros preocupados em aparentar responsabilidade com o meio ambiente, mas são falsas obras de arte.

O merz verdadeiro, como eu e você praticamos, não se deixa conduzir por moralismos do momento, ele não tem a utilidade como razão de si. O seu autor não abdica do estar-aí, do "ser-no-mundo" e no outro, como primazia da consciência-de-si-no-mundo. O gênio, ao contrário, despreza valores que possam contrariar o luxo idealizado por seus compradores e faz um lixo estilizado.

Para avançar ao conceito, uso a sintaxe anti-nazi de W.Benjamin: afinal, o que é o merz? É uma experiência singular, composta de elementos espaciais e temporais, mas também de relações plásticas, tensões visuais, e sensações conceituais geradas pela descontextualização do elemento descartável. Foi nomeado por Schwitters em 1919, quando usou em sua colagem um folheto de um banco comercial (comércio em alemão = kommerz).

Um dos princípios fundamentais do método de Schwitters consistia em escolher materiais descartados, ordená-los, sobrepô-los e pintá-los parcialmente, de modo a tornar muitas de suas características e textos quase completamente ilegíveis. Obtinham-se relações de tensão compositiva e novas leituras para os "Descartes". Conceitualmente esse princípio pode ser resumido como alteração das relações funcionais com o objeto. Da importância à massificação e do apelo utilitarista vai-se à experiência única, tanto de criação quanto de uso. Das coisas mais ignoradas nas relações despersonalizadas e anômalas vai-se à plasticidade e à percepção. Não há a mínima necessidade de asfixiar a falta de originalidade dos materiais utilizados.

segunda-feira, agosto 30, 2004

porra, blogger, devolve meu texto!

domingo, agosto 01, 2004

031
Seu andar confuso não fazia som.
Toda fotografia é muda.

quinta-feira, julho 29, 2004

O quê que esse blogue tem
122 posts, esse é o centésimo vigésimo terceiro.  Número razoável, pois aqui não se preza por quantidade, nem por qualidade. Toda qualidade deve ser atestada por um agente, por uma entidade externa. No caso do eau de parfum não existe essa entidade, apenas conflitos (ou mesmo afinidades) com meus leitores. A irreconciliação comigo mesmo precede a assistência, de maneira que esse fator é mais preponderante ainda do que ser lido, porque uma das intenções maiores do artista é ser o seu próprio público. Nesse aspecto eu assemelho-me-o.

Leite em pó
Por uma lata de leite em pó (na faixa de R$ 5,60) se assiste a uma sessão de filmes não-narrativos. São curtas e médias metragens produzidos dentro, em afluentes ou desmembramentos do Surrealismo e da vídeo-arte. Filmes que despertam a fúria de pequenos cineastas direto da Disneylândia para a Universidade (coisas muito semelhantes, só que na Universidade o teto do trem-fantasma tem rachaduras e despenca de verdade), mas de linguagens tão distintas das tradicionais produções comerciais ou narrativas que seria difícil julgar uma diante do tribunal da outra.

Hoje assisti ao "Water and Power" (1989), de Pat O'Neill. Para amanhã a programação prevê vários curtas, três de Man Ray, um de Duchamp, outro de Fernand Léger. Os nomes provavelmente são conhecidos de muitos, tratam-se de artistas multimídia que tiveram grande repercussão internacional dentro das artes plásticas. Os ingressos são retirados na recepção do Conjunto Cultural da CAIXA e quem quiszer ir comigo amanhã tem o meu leite em pó: uma entrada grátis!!! Imperdível! Tudo bem, reconheço que por esses dias estou meio mão aberta. Mas o que é que tem? A doação é para o Fome Zero.

Já que esse evento faz parte do Foto-Arte, tomo a liberdade de convidar a todos para a exposição de Lartigue ("Moi et les autres"). O fotógrafo é formado pela inspiração e pela técnica. Há tempos eu evitei mencionar essa tal "inspiração", mas devo reconhecer que algo ronda outros sistemas menos rígidos, severos e destrutivos do que o meu próprio pensamento. Sua atividade com a câmara começou aos seis anos de idade, junto com um diário sobre sua relação com a família e amigos. Sua versão de álbum de família é registro, não fetiche, o registro da dialética e da interação entre aparelho e ser humano e também da expiral do tempo a voltar-se sobre si em desencontro.

Convido-os também para a exposição do Grupo 01, na CAL, em que Ruth nossa amiga está expondo, e para "Muros Invisíveis", da Neila, outra nossa amiga, no Espaço Cultural Renato Russo (508 sul). Não pretendo passar por companheiro promíscuo para com minhas colegas primogênitas, mas ainda não as visitei. Admiro, entretanto, ambas, a Ruth por entregar-se à experiência insólita, mórbida e procesual da técnica, a Neila por fazer uso do incômodo de uma linguagem muito pessoal e que manipula uma estética abandonada pela vontade de ver gordurosamente que paira em toda a sociedade: a excelência de sua composição e nitidez fotográficas são qualidades justamente no apagamento posterior que sofrem, no embaralhamento de imagens e na impressão desbotada (espero que a instalação esteja tão boa quanto as impressões).

Até  esse fim-de-semana.

sábado, julho 17, 2004

Sexo: muito diferente de quatro dê
Vão-me desculpar aqueles que desejam saber o dia do término da exposição "O Pornógrafo", eu não sei, mas antes fingir ser uma celebridade da e-pornografia a emprestar sua cara ao Mikey. Aquilo, sexo como interação virtual impressa e temporalizada, você pode experimentar, por enquanto, na galeria da UnB.

Esse é o tipo de encontro entre realidades que não se realiza na pretensão sapientista de uns ditos "pesquisadores". No CCBB, lá onde uma quarta dimesão tem sido referida para disfarçar deficiências nas ilusões bidimensionais miméticas de um 3D obsoleto, conceitos dos mais ecléticos se debelam para justificar atos viris demais. Trata-se da exposição "maior ou igual a 4D". Nada de errado em performances de corpos informáticos ou em uma projeção de serpente em morrinhos de areia. Aliás, é até muito competente quem viaja pelo Brasil levando a casa nas costas, como a tartaruga e, com isso, desenvolve teses maravilhosas. Mas acreditar-se pesquisador de ponta, ou de vanguarda, expor uma velharia que foi abandonada pela Atari, Sega e Nintendo ainda na década de minha (sua e nossa) infância e ainda frisar sua grande habilidade em ser artista multimídia e avançado é incoerente. 

Um dos nossos paridores nesse momento em que os títulos e as imagens de enunciados demasiadamente explicativos tentam tomar o lugar da competência prática e empírica deveria ser o Eco, o Umberto Eco. Ao falar do tempo do conteúdo, diz que o enunciado é típico da "expressão" (que põe assim, entre aspas) física da obra de arte. Nela há vários tempos, um deles é o de recomposição, que está explícito em um quebra-cabeças da mostra "O Pornógrafo" de autoria do João, nosso amigo (o brinquedo recompõe ao ser montado). O tempo do enunciado possibilita o aparecimento de um outro, o da enunciação, que é o da coisa representada ou, pode-se conceber, da coisa (re)assimilada. O que temos, entretanto, em uma das galerias do CCBB é o total despautério entre enunciado, enunciação e interação. O artista prepotente (quero dizer, "pesquisador") é tão capaz e superior que realiza a façanha de o discurso sobre a coisa existir antes dela (no que não há problema, mas) sem sequer implicar em sua origem, em sua construção factual ou manter qualquer ponto de contato com ela.
 
O que vemos são enunciações falseadas e sem lastro esnobando volúpia e um brilho ofuscante cheio de opacidade discursiva atravessadas como espadas no olhar entre o visitante e os enunciados da obra em suas características assimiláveis. Sinceramente, os pênis de chocolate da meg são mais apetitosos do que essa vontade portentosa e oca.
 
P.s.: Meus professores (inclusive os meus amigos), eu vos adoro, vocês são grandes pesquisadores, mas esse seu recalcamento elitista não se pode suportar. Espero que vocês não formem pesquisadores dessa elite postiça.

sábado, julho 10, 2004

Ah, enfim, as idéias assentam-se... As férias chegam lentamente e eu te amo, desiludida comigo! Reconheço, deprimo até os pombos, os gatos, as formigas, os móveis, mas meu peso, na verdade é 57: de tanto trabalhar parado engordei um quilo.

Viva nós, os ofendidos que usam roupas brancas!

028

Como são doces esses pensamentos
Como são feitos de cana
E vapores de alambique

Vendo assentarem-se logo em frente
Faço calarem em minha mente
Lente que não demonstra todas as verdades

Quem os lê embriaga-se porulento -
Transpiração diáfana
Decantada desse chão de vaidades

Estamos acima de qualquer sujeira
Límpidos, isentos
Enganados.

quinta-feira, julho 08, 2004

Se você está elaborando mentalmente algum tipo de pergunta sobre meu paradeiro, não se preocupe, ainda estou vivo.

1) Tem um virus chato no meu computador e dois anti-virus pesados e ineficientes atrapalhando que eu navegue pela Internet. A solução é formatar o HD e instalar tudo o que for útil outra vez, mas cadê meu tempo e minha organização? Alguém os viu por aí?

2) Puta que pariu! Merda! Quem inventou a droga da caricatura? Eu detesto essa porcaria bonitinha apelativa sentimentalista. Eu defeco pra essa merda toda humanizadinha cheia de personagenzinhos. Ai, que bosta! (Se eu desabafasse isso com alguém ia causar um certo espanto, então optei por não dizer, mas escrever no blog, porque é uma merda gente sorumbática me olhando - pelo menos hoje).

sábado, julho 03, 2004

Porque não tomamos uma bebida mais forte agora?

Afinal, somos só uns cinco leitores contando comigo, e escrevo até mesmo para quem poderia ser meu vizinho, daqui de Brasília, que a conhece tanto quanto me perco no plano x/y e fora dele. Mais umas visitas esporádicas de São Paulo, um ou outro colega dali da UnB, alguns sujeitos bem peculiares e com quem compartilho de umas e outras simpatias, a namorada com dois anos de companhia e...

Ah, sim, é espantosa a companhia: do que nós gostamos é dessa morbidez solitária e estabilizada, uma duplinha perfeita, mas talvez seja para poder quebrá-la-quebrá-la-quebrá-la-...: destruição contínua. Mas é só hipótese, e quem não concorda com essa forma de matar a si e a outros junto não pode fazer o que faço. Nem namorar e ser fiel, nem trabalhar em atividades técnicas e repetitivas, nem estudar em uma Universidade, nem tentar ser chato, incoveniente ou sóbrio demais. Não pode também confessar essas coisas em um blog, porque isso pode comprometer certos propósitos, pode deixar transparecer certo sadismo em asfixiar o mundo consigo.

Quem, afinal, não gosta de deixar uma fumaça arder laringes, fagócitos, narinas e entupir vasculares? Quem não experimentou um dia, silenciosamente, o torpor da morte anestesiando a carnalidade das coisas reais? É uma força maníaca e psicótica que nos coage na intimidade. Esse é o sadismo de apresentar o vazio incômodo presente nos heróis ansiosos e permitir um pouco de nojo por quem não entende o que vê ou, como um professor que olha um quadro, entende tanto que acaba achando ser inverdade. Não pode haver no sarcasmo tanta clareza técnica.

Enfim, senhores, de volta às férias pela UnB, após o auge do meu treinamento excentricista, um semestre de dedicação em ser chato, sou novamente quem sou, esse tímido-introvertido. Alguma coisa, entretanto, uma fagulha, mudou a pólvora comprimida na visão-vista. Haja falsidade nesse teatro, mas adoro todos de amor profundo e verdadeiro.

sexta-feira, junho 04, 2004

Tudo muito complicado...
Porque ser hermético?
Como ser hermético?
Como não ser hermético?

Hermetismo se consegue abrindo os olhos,
Só não consegue cerrá-los mais.

Vendo, assim, muito e pouco
É muito mais simples
do que atentado.

É solitário,
Tanto quanto o direto e claro,
porque simples é edição
canhestra de moto-catástrofes dialéticas.

Objetividade provoca
Eu lírico.

sábado, maio 29, 2004

"Sus, tomemos um escritor deveras límpido e irrepreensível. Não vale a pena submeter a um exame geral exatamente este ponto: se, em poesia e prosa, devemos preferir uma grandeza com alguns defeitos, ou uma mediocridade correta, em tudo sã e impecável?" (LONGINO. Do Sublime).

Certo dia me disseram que uma obra de arte tem que ser bela. "A beleza é a harmonia de todas as partes". Quantas pessoas se identificam com essa frase um tanto sintática? Dizei-me, então: "é nisso que está a perfeição de sua construção, pois é sintática e além disso é simples!". Respondo que quem engana estará fora da República, e essa simplicidade é forja da falácia.

Não quero dizer que existam frases assintáticas, mas que, como se pode ouvir em alguma música do Radiohead, o que se sente nem sempre existe. Harmonia, por exemplo, é algo um tanto fugidio, miragem etílica. No pós-tudo não há um impulso que, descoberto, é omitido em nome da forma sensível e da dosagem equilibrada. Por exemplo: a pobreza foi um tema não-grego, desarmônico, para Portinari, mas não há muito tempo, visitei à retrospectiva do artista plástico Milton Ribeiro, e lá estava a pobreza harmonizada. Algo pareceu conraditório: estudos do expressionismo.

Tanto o expressionismo quanto o meio, ou a mediação, marxista, podem ser condenados e executados sem merecimento. Todo meio é ignorância, assim é aceito na ligação fácil que se faz entre a beleza e os clássicos. Esse desconhecimento, entretanto, é uma das verdades do trabalho. Se atribuem ao modelado por veladuras status de técnica suprema, qual seria o motivo? Será que foi ingênuo o italiano que pensou que seu grande painel não era um rascunho, mas uma Obra com "O" maiúsculo?

Dedicar-se ao trabalho de imitação e ao ensinamento não gera equilíbrio, nem harmonia, a não ser em relação a uma estrutura singular. Assim, no momento em que colocamos na boca dos clássicos, e nossa, uma leveza atribuída tanto a eles quanto a Salvador Dali, lemos dos nossos antigos algo que demonstra nossa própria alienação quanto à fantasia surrealista. "Suponhamos que um pintor entendesse de ligar a uma cabeça humana um pescoço de cavalo, ajuntar membros de toda procedência e cobri-los de pernas variegadas, de sorte que a figura, de mulher formosa em cima, acabasse num hediondo peixe preto; entrados para ver o quadro, meus amigos, vocês conteriam o riso? Creiam-me, Pisões, bem parecido com um quadro assim seria um livro onde se fantasiassem formas sem consistência, quais sonhos de enfermo, de maneira que o pé e a cabeça não se combianssem num ser uno." (HORÁCIO. Arte poética). Eis a estrutura ora refutada, ora ensejada, à qual se costuma atribuir uníssono que não pode ser, senão, nosso mesmo, o público leigo dos OUTROS, distantes e mortos, nos quais só vemos espelho e contigüidade.

Todavia, de fato, a estrutura daquele trabalho ligado ao saber clássico, hoje, parece tão longe quanto os poetas latinos e o ditirambo. Em lugar desse, temos o baile funk, mas também conhecimento de várias verdades. Admite-se, por exemplo que, em lugar da veladura finíssima e delicada, metam-se empastos grossos, suculentos e desconformes e, em lugar da dedicação ao aprendizado da fineza, o afinco ao estudo da grossura. Todavia, o artista, nos dois casos foi considerado legítimo para expressar sentimentos da alma por repetir procedimentos. Tanta expressão não estaria, ao contrário, justamente naquilo que não é considerado? À margem corre o erro, a "grandeza com alguns defeitos" de um antigo anônimo, marginal, que hoje chamam de Longino.

Já que a perfeição, a beleza e a harmonia são vistas simultaneamente de pontos de vista tão diversos, poderíamos dizer: trabalhar é ser ignorante. Hoje, os croquis de Leonardo são expostos em grandes museus e em galerias internacionais, atraindo enorme quantidade de público leigo afeito à beleza clássica estratificada no meio de um sistema sem ordem e massificado. Justamente esses rascunhos subtraídos quando a pintura não tem furos, apenas é imagem convexa, são a prova do lesbianismo e da imperfeição enrustidos na idealização estéril, por mais prazerosos que sejam.

sábado, maio 01, 2004

Dia do trabalho
Só em São Paulo -
Milhares na Praça da República.
Em Brasília, doze horas.

Há dois anos eu pisava naquela cidade: meu eu retrógrado entrou em revolução.
_______________________________

E o filme proibido está no ar. Senhoras e senhores, mais que o enterro de Di Cavalcanti, o poema de Glauber Rocha:
http://www.dicavalcantidiglauber.us/

sábado, abril 17, 2004

A surrupiação
UnB - segunda-feira, 12 de abri de 2004: a história do Centro Acadêmico de Artes Plásticas da Universidade de Brasília foi queimada após seu armário ser arrombado e Departamento ter dado baixa no móvel. Não se identificou ainda o autor da surrupiação. Nem todos a rondar a área são confiáveis e o próprio VIS (Departamento de Artes Visuais) esteve, durante a semana, levando para o depósito móveis sem dono que ocupavam o antigo espaço do Centro Acadêmico.

O armário contendo toda documentação do CAPLAS, incluindo atas das reuniões e registros diversos desde sua fundação, ocupava espaço provisório, definido em votação do colegiado e intercalado com aulas. Lá mesmo se perdeu o maior e mais relevante patrimônio representativo da participação política organizada dos Estudantes de Artes Plásticas. O evento marca o cume de uma série de golpes sofridos contra a reestruturação de base tentada desde o início de 2003.

De lá pra cá, inúmeros incidentes desgastaram a relação entre os representantes dos estudantes e a chefia de departamento. Nesse ínterim, merecem destaque crítico tanto a inexperiência do CAPLAS e sua atuação informalista quanto postura ambígua da Chefia a despeito das reivindicações dos estudantes, o que também é validado pela informalidade generalizada. Alguns eventos exemplificam essas prerrogativas negativas e valem ser postos novamente à tona.

Quando se sabia, diante de anúncio oficioso, mas sem assinaturas, da participação do CAPLAS em comissão para reestruturação de espaço, a tal resolveu às escuras reunir-se à parte, esquecendo, cinicamente, os estudantes. Nessa mesma ocasião, por três vezes, duas seguidas, o mesmo assunto de pauta foi omitido pela chefia em reuniões de Colegiado. O assunto era a reinclusão do CA nas conversas sobre reestruturação do espaço físico do VIS.

Entretanto, diante de pressões e traumas a pauta foi aberta. Alegando que o CAPLAS não tinha atividade visivelmente constante, o Colegiado votou pela divisão do Ateliê 1 entre CA e aulas. A proposta abaixo-assinada pelos estudantes e encaminhada ao Chefe de Departamento era ocupação integral do espaço, bem como a melhoria de suas condições de segurança e início de direcionamento a atividades com a comunidade. A negação a esse pleito exacerba-se com o fato de dois alunos de Artes Plásticas terem sido pegos em flagrante furtando o PC do CAPLAS, doado por uma de suas colegas. O aparelho teve perda total ao cair das mãos de um dos criminosos.

Como atos exemplares, no entanto, vieram queixa à polícia e punição (à altura ou não), tanto do criminoso maior de 18 anos e de seu pupilo, quanto de todos os outros alunos. Reclamam os que não possuem micro que, além de serem prejudicados ao realizar seus trabalhos acadêmicos, ainda têm de conviver com impossibilidade de uso do laboratório localizado dentro do próprio VIS.

É de se espantar, portanto, que um corpo discente já descrente e apático com relação a políticas e reformas na Universidade, em seu currículo e na infra-estrutura de seu curso tenha passado por surrupiação tão pungente. A extensão histórica da passagem de gerações de aprendizes, que antes tinha seu espaço, ainda que pequeno, em algumas prateleiras de um armário velho, agora só existirá em fragmentos longínquos, em memórias tão fugazes quanto nossa carne. Apodreceremos todos em meio a esse mal, patético, que é a reivindicação egoísta da fala e do poder, do esqueleto, do espaço e das futilidades de que todo corpo oco diante de egos heróicos se enche ao tentar extinguir Histórias. A verdadeira tautologia do vazio.

________________________

027
Quem morre faz poesia.
Viva.

A Língua grassa agonias,
Dita -

Doura
E finca a daga impávida

Chofra -
Dor sente quem a instiga,

Arde,
Pensando que poesia

Salva.

domingo, março 28, 2004

repulsa ao sexo em uma introdução para dissertações de vestibular
Carol entrou no escuro. Do salão de beleza foi pra casa, fechou as cortinas, apagou as luzes. Esse é o aspecto alegórico de interiorização anômica visto em Repulsa ao Sexo, filme sobre o conflito pessoal de Carol diante da sexualidade e das suas relações familiares. Círculos de freqüência masculina, o bar, e feminina, o salão de beleza, constituem partes do drama da personagem. Assim, de limites do discurso social e familiar, vai-se a limitações do indivíduo.
__________________________

começo feliz
Cinco pessoas no primeiro encontro do novíssimo grupo de estudo de fotografia mostraram grande diversidade de intenções como fator preponderante. A qualidade marcada por cada participante dispensa a inflação exarcebada de pessoas, o que não impede a quantidade de adeptos estar aumentando pouco a pouco. Novos pensadores se apresentarão dentro de cerca de uma semana, quando todos proporão plano de ação individual para os próximos meses. Além dessa atividade pessoal, proposta de aprendizado e investigação conjuntos deverá ocorrer.
__________________________

Sobre a surrupiação: o que aconteceu de espantoso na semana passada.
O que é um oceano visguento? Aquele do qual não se vê o fundo, mas do fundo vem o que nos olha e novamente afunda. Assim, do fundo novamente surge algo mais de desconhecido que também nos olha. É assim a maré de que nos fala Didi-huberman, a que se dá ao conhecer do mundo; conhecimento que só percebe na medida em que todo o mais se oculta. Esse mundo se assemelha ao maior de todos os mistérios, que é o túmulo, sobre o qual pensar, em seu sentido simbólico e espiritual, levará sempre novamente à coisa-no-mundo, ao ser-no-mundo de Heidegger. Então o mistério que produz a sensação tanto do conhecer quanto do não saber, forma um sentido de existência, de presença de si no mundo.

Se o sentido daquele que olha é aquilo que é visto, então, o que acontece quando é surrupiado aquilo que se vê e que nos olha? O que ocorre quando algo ou, sobretudo alguém que nos agrada conhecer (logo, desconhecer) desaparece misteriosamente sem deixar rastro? Resposta (nunca) em breve.

domingo, março 21, 2004

Hoje não tenho assunto, mesmo passada uma semana do último post. O motivo é o grande espanto que nesse momento procuro rechaçar e que está presente em todos os meus pensamentos, absolutamente irrefutável. Sim, porque me faz debelar com minhas crendices e ao mesmo tempo torna literais muitas metáforas e algumas hipóteses que sustentam teorias impressionantes.

Como é difícil encarar certos acontecimentos que mais parecem mitologias, deixarei uma pista novamente metafórica dessa angústia. Imagino, ao mesmo tempo, o quanto já deixou de ser dito para ser proposto assim, alegoricamente e esvaziado... Seguirei, entretanto, nesse rumo mais ameno.

A hipótese é: às 16h você está diante de uma paisagem que o agrada. Num momento em que ainda está em contemplação, certa brisa forte incomoda seus olhos. Então, você pisca, tampando a fronte com as palmas das mãos, franzindo o cenho e enclinando para baixo o rosto, como proteção. Logo cessa a brisa mais forte e você retoma sua posição de contemplar. Mas, para sua surpresa, não encontra mais a paisagem que antes via. Está no mesmo lugar, sentindo a mesma brisa, mas em lugar da paisagem há um recorte fulcral e somente negrume, como se uma tesoura houvesse destacado desde o céu até certa altura da vegetação e uma varinha de condão tivesse sumido com esse pedaço recortado. Você gela, tenta acordar, mas não é sonho, seu coração dispara; quanto mais tenta entender, maior o incômodo. E agora?
_______________________

Incomodado e vivo
Mas muita coisa ainda existe e coisas boas continuam acontecendo. Por isso, anuncio, o primeiro encontro do grupo de estudo de fotografia será amanhã, às 19:30h, no Espaço Cultural Renato Russo, na 508 Sul. É um encontro bom e importante. Você aí, que gosta de pensamento e de fotografia, está convidada(o).

domingo, março 14, 2004

ponto refinal
Ah, o que dizer nessa hora que passa sem que ninguém descubra o que quer que seja? Passou... Acabou... Morreu... Mas aí tudo continua. Altares vão sendo erguidos para adoração de imagens cada vez mais vazias, mais invisíveis, a ponto de os adoradores pensarem que não adoram nada. Às escuras, toda fé aumenta a cada dia e adora ilimitadamente.

Amanhã vamos à Universidade. Em busca vaga por um ponto ínfimo, aquela questão que incomoda, será acrescentado mais um pedaço de merda ao altar imaginário. O pior é que "a pergunta que não quer calar" sequer existe. Os objetos desses pensamentos que buscam isenção e querem VERDADE são pura impotência travestida.

E eu estarei lá, com todo o meu ceticismo e sem esperanças na tal Universidade pública e de qualidade. Todos procurando aquela palavra, aquela COISA, aquela resposta. E o semestre vai passar sem que ninguém descubra nada. Isso é uma angústia, principalmente porque sou assim também, o tempo todo em busca, e posso dizer que é um incômodo. Preferível seria o Jardim do Éden com a Eva de perna aberta...

Dormir nas férias estava tão bom...
____________________

Parabéns à poesia pelo seu dia!!!

domingo, março 07, 2004

fotografando a Arte 1,99
Quem não foi ainda à exposição Arte 1,99 na galeria da UnB (406 Norte) precisa ir logo, caso não queira perder. Ela fica aberta de 13 a 19h, de terça a sábado. Acredito que não conseguirá manter-se até a quarta-feira, porque estão comprando tudo. Achei bastante surpreendente a elaboração que a Patrícia Bagniewski conseguiu nesse trabalho e pude notar que algumas questões interessantes para mim estão lá nela também. Adquiri um livrinho fofinho com uma tesoura, contendo instruções de ler o livro fofinho e picotá-lo com a mini-tesoura colegial. Isso, apesar de conter uma idéia de infantilidade nos objetos, me conduz diretamente ao pensamento do personagem de Dostoiévski em "Memórias do Subsolo" reconhecendo com um certo deboche o prazer que se tem em sofrer. E ele mesmo sofria, e sofria porque nisso tinha prazer. Mas, diferente daqueles que gemem quando estão doentes, não pretendia esconder sua vontade de dor sublimada no gemido. Não entrarei em pormenores psicanalíticos. Basta notarmos apartir de um semelhante - o personagem citado, auto-denominado um rato - essa vontade de auto-flagelar-se ou buscar o cáustico como fórmula do prazer. Isso basta, pois "a mente perspicaz é uma doença" (como seria entrar em pormenores psicanalíticos), visto que nos leva à negação desse princípio em função de um distanciamento da matéria e do sentir para instaurar-se a palavra no lugar da coisa. E vendo naquela inocência infantil dos materiais a minha própria incapacidade de ser mais do que uma criança, ou seja, de não poder sentir mais do que ninguém aquilo que se põe no meu caminho e que resolvo notar à minha maneira, me figuro imediatamente no livro. Tenho vontade, então, de picotá-lo até mesmo com a tesoura cega!!! Mas não abrirei sequer a embalagem.

É essa a dor inteira de uma obra de arte ou de uma fotografia e, além do mais, no caso dessa, um sentimento de que jamais algo fotografado será recuperado, mas justamente por parecer que sim, que de todas as maneiras o fotografado está ali impresso. Isso não passa de baixeza e enganação.

Comecei nesse assunto agora para falar do grupo de estudo de fotografia. Ele começou a ser divulgado ontem, amanhã será mais um pouco, e até a quinta-feira devo publicar no grafias o projeto completo para aqueles que aderirem ao grupo.

Bom domingo e ótima semana pra vocês. Não esqueçam de ir à "Arte 1,99".

sábado, fevereiro 28, 2004

(foto)grafias
Na semana passada, falávamos dos livros empoeirados não lidos, acumulados em nossas estantes. Antes ainda, falávamos de "andarilha, criatura" andarilhando em auto-reverberações incessantes. Na semana trespassada, o assunto era a humanidade do artista, seu mundanismo laico, limitado e normal. Esses temas podem confluir muito apropriadamente para a abordagem filosófica da fotografia. E essa confluência é especial nesse momento em que surge um novo grupo voltado à fotografia, ao seu estudo, principalmente, voltado à pesquisa e produção independentes.

Temos, no próprio blog, uma das variáveis conversíveis em favor de ações que se pretendem independentes. Essa mídia é, talvez, a menos obliterada de todo o planeta. Esse eaudeparfum aqui, por exemplo, se tornou praticamente um periódico onde o autor publica o que quer. Realizando o trabalho também do Editor, seleciona para publicar, desde o início do veículo, textos segundo seu próprio critério.

Não que essa liberdade deva prevalescer em toda imprensa. Isso seria um jogo sujo contra a qualidade. Mas há o que se aprender com esse tipo de veículo de comunicação. Justamente pelo aspecto pouco profissional, ele revela um quê de despreocupação. Não há ações a perder, nem patrocinadores a espantar. E nisso (no contrário disso, precisamente) também reside o pouco profissionalismo de, por exemplo, jornais patrocinados pelo governo e por algumas empresas tradicionalistas.

O jornal é, por excelência, o veículo da instabilidade, e a ele seguem-se todos os outros periódicos, em menor grau voláteis. A falta de profissionalismo está, apesar da credencial dos jornalistas e da sua inquestionável dedicação e competência, na seleção do editor e na coordenação do veículo com fatias do poder de barganha ou político. Atrelar-se ao capital ou a governantes é entrar em sua lógica. Para essa lógica apenas há fatias, direitas, esquerdas, e aquelas diferentes desprezíveis que, se não entram nas matérias positivistas, também não aparecem nas críticas, espaço reservado à esquerda. Portanto, boa parte do conhecimento produzido e das ações possíveis que poderiam ser mostrados permanecem ocultos. A taxada esquerda vai, por sua vez, sendo tratada como malévola.

Essa possibilidade de abertura, se tem sido de certa forma subaproveitada pela imprensa, teve sua grande chance com um outro invento moderníssimo. A fotografia tem entre suas características desde os primórdios uma afinidade com o mundo externo. O ato fotográfico, como o artista em seu prosaismo, está intimamente associado às coisas circundantes. Ele recorta fatias e fragmenta a imensidão de possibilidades visionárias. Nisso reside a instauração de uma comunicação fértil.

Inevitavelmente, associa-se o ato fotográfico à linguagem, reverberante, como uma criatura andarilha, impossibilitada de simbolizar o todo, afeita mais aos significantes do que à coisa em si. As ambições de chegar a um todo convivem também com a fragmentação necessária à existência dessas ambições mesmas. Tenhamos, talvez, a impressão de evolução, que por sua vez não passa de acaso motivado pela nossa própria condição subjetiva. Não podemos senão conhecer vestígios do mundo presente ou passado.

Este é o lugar de um livro ou uma foto. O estilhaço. Ambos são pensamentos em processo e pós-processo. Ambos evidenciam a impossibilidade e a ausência. Nem um nem outro são a realidade, por mais realistas que aparentem. No momento em que escrevo essa palavra, infinitas outras deixam de ser usadas. E o melhor parece ser cometer esse assassinato, ou anonimato. É o que fazemos, severamente, talvez acreditando em algum flanco, ou fenda, ("riss", para Kant), ou ocultamento, "lichtung" (Heidegger), para o nascimento de um "Unverbogenheit", a reverberação da linguagem (Foucaultiana) em termos Heideggerianos. Essa perspicácia nos permite subjetivamente situar em meio à diversidade. E eis o sentido de ancorarmo-nos por nós mesmos, que é o sentido do ato fotográfico, literário, ou criador de modo geral: "Melhor um livro na mão do que dois mofando".

Esse é o princípio do grupo de fotografia que está sendo criado. O princípio da independência e da diversidade, fragmentário, que se podem combinar de infinitas maneiras. Convido todos os meus leitores que tenham algum interesse em pensar tendo a fotografia como auxílio ou parceira e a discutir toda essa imensidão possível em seu prório ato, seja de escrever ou produzir objetos de arte. Convido-os a integrar o grupo grafias. Vocês podem me contatar no e-mail à direita e acima, logo abaixo da imagem da pintura, para pedirem o projeto do grupo. Para associarem-se à lista de discussão, basta enviar e-mail em branco para grafias-subscribe@yahoogrupos.com.br. Para acessar a página do grupo após associados, usem o endereço http://br.groups.yahoo.com/group/grafias/. Quem tiver meu telefone, pode me ligar a qualquer hora.

Para dirimir a curiosidade sobre a marca, explico-a. O conceito de diversidade de caminhos tomados pelos diferentes componentes e coesistência harmônica entre os mais variegados conteúdos foi expresso na escolha do nome grafias, no plural, em letras minúsculas. A divisão do subtítulo do grupo na lista de discussão (foto)grafias, sugere essa diversidade sendo abordada apartir de um procedimento análogo ao da escrita com a luz. Ficam em aberto as problemáticas que a mídia, a técnica ou o processo suscitariam, bem como as formas de abordagem do tema.

sábado, fevereiro 21, 2004

auto-
Lendo algumas postagens passadas vejo o quanto são superficiais. Pelo menos divertem e fazem pensar. As últimas, em protesto aos mitos em torno dos criativos (que, aliás, somos todos), renderam exatos nove parágrafos cada. o que é isso? Talvez um carma? Sei lá, não acredito nisso, mas por via das dúvidas, darei vivas ao nove e vou chispar daqui bem rápido!!! Quero dizer, estou com medo, mas continuarei aqui, como prova da minha coragem.

o oferecimento
Meus cinco leitores ou talvez mais alguns (e posso me gabar de conhecer todos) talvez tenham estranhado o repentino patrocinador aparecido nas minhas últimas inquietações virtuais. Mas esclareço o oferecimento de "Melhor um livro na mão do que dois mofando". Chegou a hora da verdade, aquele momento ébrio, propiciado pelos estabelecimentos menos ostentosos e mais aclamados da nossa sociedade, os botecos copos-sujos.

Explico ainda que "copos-sujos" adjetiva "botecos", e "sujos" adjetiva o substantivo no plural "copos", por isso a flexão do vocábulo composto "copo-sujo". Com isso, sou o primeiro ser do mundo a flexionar corretamente para o plural o referido vocábulo-de-botequim.

Devidamente alegre, mas frustrado por me sentir solitário e longe da farra nesse carnaval, reivindico meu diploma de professor honoris causa, depois, é claro, da apresentadora de programa Hebe Camargo e do Presidente Lula. E viva o Brasil, Rio de Janeiro, futebol e mulata! Estou, de fato me sentindo um gringo nessa terra. Gostaria de falar Tupi, isso aparentaria mais patriótico (quem sabe?).

Mas enquanto a língua é ainda portuguesa, não estado-unidense (no lugar de inglesa) ou do naipe da disfunção italianista de grandes construções candangas, apresento-lhes o mais estrondoso programa de contenção de gastos para os compradores compulsivos de livros. "Melhor um livro na mão do que dois mofando" é o nome da campanha. Ela nasceu de uma incursão à segunda porta do meu guarda-roupas, quando verifiquei o alto volume financeiro gasto e mal aproveitado. Assim como as estantes de todos os pais do mundo, que acabam comprando coleções inteiras e não lendo quase nada, estava eu caíndo na obsessão antiliterária.

Poemas de Castro Alves, Alvares de Azevedo e Machado de Assis; clássicos como "Assim Falou Zaratustra" e "Crime e Castigo", todos subaproveitados. A libido, ainda assim, mandava-me à compra de mais e mais, além de tantos que retirava na biblioteca sem chegar a ler. Permiti-me avaliar dentre meus colegas a incidência do mesmo caso. Todos os que investiguei têm a mesma tendência. Faz-se urgente e necessária essa empreitada de aproveitamento do conhecimento contido e de contenção de aquisição de livros sujeitos ao mofo e à poeira. Por isso:

Esse post foi oferecido por:
"Melhor um livro na mão do que dois mofando"

domingo, fevereiro 15, 2004

"Melhor um livro na mão do que dois mofando" oferece:
Andarilha, criatura
Nem um pouco vaidosa. Jamais parara, a criatura, em frente ao espelho, para notar seu rosto assimétrico ou sua escoliose? A pele, cheia de manchas, variações de matiz salmão, e cascalhoada, descamava-se, como se os poros penetrassem-lhe dentro à carne. Quase não demonstrava aflição. Aquilo de aparentar serena era um mistério. Humana e bípede, tocava o ar com facilidade. Sua verdade, para mim, era plana. Sua cidade mimetizava-se a si mesma de concreto bastante verossímil. O toque da criatura causava ondas concêntricas no plano sensível da cidade. Ao desdobrar-se, então, regurgitava-se pra fora e pra fora. Sempre para fora. Assim, ia caminhando, com os pés, vomitados pela boca, indo novamente ao chão e adiante, e os órgãos internos postos a flutuar. Em seguida, pela boca novamente o lado direito externalizava-se. Aqueles órgãos, deformados e fora de ordem, eram retidos no avesso. Repetir isso era sua vida de andarilha.

______________________

O.B.S.:
1) Enquanto não encontro outra maneira de deixar que as pessoas me mandem e-mail, vou deixando ali à direita mesmo meu "Lan"zinho discreto. Confesso que não tenho me empenhado em descobrir essa nova maneira. É um péssimo costume, aliás, as pessoas acharem que conhecer e fazer amigos na mídia interativa deva ser necessariamente fácil e rápido... É o mesmo pensamento da indústria da putaria, que me manda mais de vinte e-mails por semana por causa dessa minha teimosia de deixar meu endereço no Blog. Pelo menos eles aproveitam a oportunidade, embora sejam uns idiotas.
2) Em breve ficaremos temporariamente sem imagens, problema que não deverá durar mais de duas semanas.

domingo, fevereiro 08, 2004

Além da Orelha
Quem pariu Mateus que o embale, andam dizendo por aí. Em uma alusão ao amor próprio, é possível declarar-se o não comprometimento com o problema dos outros, como faria um João-Sem-Braço. Pensar olhando em torno e voltar a si, por outro lado, é um exercício que demonstra o contrário.

Olhar em torno significa notar o próximo. Notar o próximo significa compreender as relações de diferença entre ele e o meio em que vive. Voltar a si faz parte desse saber sensível, no qual está investido um certo conhecimento de causa. Há sempre uma pequena história envolvida por várias outras.

O isolamento de um fato conduz a análises postiças. Um exemplo é o silogismo "Van Gogh era artista habilidoso; sua esquizofrenia influenciou sua técnica e, além disso, ele morreu pobre; portanto todo artista habilidoso é esquizofrênico e morre na sarjeta". Entrementes, pode-se avaliar o exemplo sem excluir essa opinião equivocada. Quem crê também é história, por fazer parte do grupo dos que agem com determinado conhecimento e convicção.

Não é dispensável o caso, pois acreditar na seqüela criadora é estar com ela. A idéia bastante difundida e Romântica de que o artista não pode enfrentar a sociedade ou compactuar com ela, afinal, tornou-se um axioma um tanto quanto teso e intocável. Um Courbet, ainda hoje, vez ou outra é chamado de um bruto por não camuflar sua atitude escondendo a verdade objetiva da pintura, nem ignorar a força política contida nas artes.

Essa tísica epistemológica é, a bem verdade, a realidade ilusória à qual os cidadãos, e mesmo artistas, puritanos, fiéis e crédulos, fizeram suas oferendas. E, ainda, um campo de minas explosivas é o assunto da loucura, porque os que crêem piamente não julgam suas convicções, mas os que duvidam, por simplesmente citarem a loucura, correm o risco de incorrerem em preconceito, em seção e isolamento.

Afinal, quem pariu a loucura? Quem pariu a idéia de que faria a loucura bem às artes e as artes, bem à loucura? Parece que está-se falando de uma espécie de "Mateus sem pai". A idéia da loucura, que vidia a cêra no ouvido de Van Gogh e para a qual se pode olhar atualmente com uma certa distância, essa, sim, aparenta fraqueza. Principalmente, quando a reação dissociativa, própria dos que surtam em manias, parece formar os princípios fundamentais de uma sociedade mundializada.

Dizia Foucault que a loucura é um mecanismo de exclusão, não feito pelos maníacos, mas pelos que a diagnosticam. Uma breve beliscada com o olhar em uma das 300.000 obras do museu de imagens do inconsciente é capaz de arrancar comentários piedosos de multidões. Um psiquiatra místico despeja sua lista incessante de mitos, um espectador de Hebe diz que é uma gracinha. Todos tratam, enfim, de classificar quem produziu a obra, apressadamente, como desajustado, sobrenatural, frágil ou digno de pena. Até mesmo concedem, do alto de sua autoridade, autorização para que um louco possa ser Artista (com A maiúsculo, ainda por cima), coisa sobre a qual nada, a não ser a milagrosa OMB, e mesmo assim no campo restrito da música, conseguiu advogar. Mais gritante: alguns estudiosos da produção técnica criativa de psicóticos chegam ao descalabro ufanista de dizerem que somente os loucos são merecedores de tal adjetivo ou Título. Afinal, como aceitar um Fernando Diniz, talvez aberração, talvez um ET, talvez Deus?

Dessa maneira, um domínio, que felizmente tem sido desmanchado aos poucos, dentro da verdade aceita, prescreve o que pode ou não ser normal e ouvido. Assim, pessoas criadoras e originais, compositoras de novos e infinitos sistemas de raciocínio e subsistência, estiveram e continuam, juntamente com o falso e o feio, exiladas por longa data. Irônico também é ver aparecer primeiro suas influências, depois o seu trabalho.

O "exotismo" modernista, tão caro à arte soterrada ou enjaulada (fósseis e coleções de trabalhos de internos), levou para o mundo uma fagulha de algo estranho e inverossímil. Hoje se pode enxergar por entre a névoa uma dissociação neurótica se apossar de uma velha episteme, que é nada mais do que a parideira. Dissociar é criar defesas e produzir ilusões diante do que se aparenta intransponível ou ameaçador. Eis que o parido, de tão grande, não pode ser embalado, é intransponível e impossível de ninar, então, presenciamos um momento culminante, em que a falência dessa instituição em conserva vai ocorrendo.
________________

Esse texto foi oferecido por:
"Melhor um livro na mão do que dois mofando".

terça-feira, fevereiro 03, 2004

O texto abaixo tem um oferecimento de
"Melhor um livro na mão do que dois mofando".

O Caso Rembrandt
Rembrandt subiu na vida e caiu na morte. É fútil, o anúncio, mas menciona o caso mais impressionante dentre os pintores que se tornaram celebridades mundialmente bajuladas (e como dizer esse "mundialmente" em termos de tempo? Talvez baste um eternamente). Em sua obra, atada simultaneamente ao plano pictórico e ao real, como também à vida, foram antecipados os aspectos mais relevantes das artes desenvolvidas no século XX.

Se você disser que eu desafino, amor, dissonante, lhe digo, parece ser a composição ilusória com a qual Rembrandt conduz o espectador ao engano. Como se a sétima maior, tão bem disposta em certa harmonia, não ressonasse em tensão irreconciliável aos ouvidos mas, sutilmente, convidasse os instintos a perceberem um novo acorde, preparando-os sempre para um devir.

SinEsteticamente, há mesmo música na imagem? Existe mesmo cadência nas telas de Rembrandt? Responderia alguém que não, que leu n'algum folheto, jornal ou ensaio que música é arte dos sons a ser entendida primordialmente em sua duração. As artes visuais seriam, assim, artes do espaço. Não só Rembrandt contradiz isso, como também desmente que a arte seja a expressão pura do espírito do artista semideus. Sua história mesma descredita a hipótese de que arte é, por outro lado, narrativa institucionalista. Acrescento que não existem, também, as tais "artes integradas". Arte é integrada por excelência! Por último, Rembrandt desmente que artista bom seja artista morto.

O pintor nasceu em Leiden, Holanda, de família humilde, tendo viajado a estudos para Amsterdã e retornado à cidade natal. A partir desse momento, se torna rapidamente um homem rico e assediado. Não só pelo seu talento, mas pela sua "habilidosa" esposa Saskia, mulher de família nobre, consegue suceder ótimas vendas e recebe encomendas diversas. O sucesso dessa empreitada não está, entretanto, como muitos espectadores de Hebe imaginariam, na aliança com a alta sociedade, mas no não abandono da pesquisa, da dúvida, da investigação, da música.

Como um compositor de uma seqüência harmônica, o pintor compunha cada um de seus elementos, manipulava a composição e a dispunha de modo impossível, mas verossímil. "A Ronda Noturna", encomendada pelo Capitão Franz Banning Cocq, mostra "A Mudança de Guarda da Companhia do Capitão Frans Banning Cocq" (título original) em uma imagem móvel onde se notam movimentos dos militares e espectadores. Um músico levantou o braço e o descerá rumo ao tambor. Um guarda deu um tiro e a guarda está se posicionando. Esse gerúndio eterno é o acontecimento temporal. Não se vêm movimentos sem que exista o tempo e, então, a harmonia combinada com o tempo, se forem aceitos os argumentos dos mais conservadores, produz, literalmente, música. Rembrandt também reintroduziu a pintura com as cores todas dessaturadas e sem diferenciação significativa entre as tonalidades dos diversos planos, assim como Miles Davis sugeriu no século XX uma música com poucas notas na melodia.

O Capitão Cocq, um bruto idiota de um tipo bastante proliferado e chato, um intransigente diante da "piroca de Ulisses" criada por ele mesmo, "como quem vê sacrafuncho em cara de cavalo" (diz minha mãe), desfez a encomenda de uma das obras mais complexas das artes mundiais. Seria ela pintura? Seria ela música? Ora, imagem mais movimento é igual a cinema!!! E por nada nesse mundo poderemos dizer, portanto, que cada um em seu compartimento. Não faz sentido aclamar uma mídia em detrimento de outra ou validar um sentido em detrimento de outros.

Esse pintor por excelência, tendo explorado a romântica pintura, de coisas fugidias, representativas do indizível, por suas manchas inimigas da natureza, indutoras do intelecto e do conhecimento anterior, estava já declinando. Perdera três filhos. Sáskia morrera e, nesse ínterim, o talentoso homem somente ganhara a "piroca de Ulisses", quase um Oscar de idiotia, por ter sido complexo e profundo.

Nas profundezas de sua profundidade, após ter até mesmo galanteado e comido a babá do único filho restante, o aclamado artista de (de onde mesmo?) Leiden declina ao ser enxotado vagarosa e vilmente dos círculos pomposos de convivas. Outrossim, não é nessa roleta ostentosa e ignota que reside sua eternidade, mas no fato de que jamais abandonou o tempo (seja a perenidade ou a fugidez), os interstícios, nem a verdade daquilo para quê estava a serviço. Sua pintura nasceu para a superfície plana e para a sabedoria dos que a olham. Sua gravura jamais negou a ação do buril ou do ponta-seca, de tal sorte que, ao mostrar a cena da deposição de Cristo mostra também a ação própria e a dos assistentes no ateliê ao violentarem a chapa. Assim, estava a serviço da história, do ser, da inteligência e da autoria.

Depois de ter subido na vida, caiu no esquecimento dos comerciantes ingratos. Seu enterro não foi assistido. Sua pecúnia, não a via mais (e agora Rembrandt?). Duas vezes rico, entretanto, engana ainda a quem se engana, desafia o positivismo televisivo e a imagem em movimento. Coloca sob suspeita o gosto e a inteligência dos financiadores das artes. Diz para os sabidões e arautos passivos Heberianos: cada coisa fora de tempo; cada um fora de seu lugar. Que gracinha é a lhama que te cuspiu!

sexta-feira, janeiro 23, 2004

propaganda
Gente, tem uma propaganda de hemorróida no meu blog!!! Leitores, aproveitem para aliviar aqui o ardor e o comichão das suas hemorróidas. Antes havia um comercial de galerias de Arte e eu pensei que alguém tivesse feito algum trabalho de segmentação em função dos conteúdos de cada blog. Vê se pode! Mas como artista costuma mais se foder do que outra coisa, até que não espanta que suas hemorróidas sejam "comichonadas" (inovações moderníssimas da Estética performática pós-futurista - nem te conto!).

Deixemos o espanto inicial, provocado pelas irritações nas pregas, um pouco de lado, afinal, a verdade é que o jargão que diz que todo artista nasceu para o insucesso é pouco creditável. No campo da Pintura, por exemplo, cujo nome mais citado para comprovar essa máxima infame é Vincent Van Gogh, os casos de sucesso somente depois da morte são raríssimos.

Na tentativa de justificar a qualquer preço tal falácia, criam-se mitos em geral associando a arte à loucura do artista. Eis o mesmo Van Gogh no centro das atenções. Por causa de uma orelha marketeira, responsável por todo o trabalho de memorização de sua marca como o modelo a ser seguido e nomeador de toda uma categoria, como uma "Bombrill" ou uma "Gillete", a fama de todos os criativos é a de serem loucos.

Outro fenômeno da mesma natureza de "O Médico e o Monstro" instaura uma conspiração ainda maior. O mais exato criador, aquele davinciano preocupado com os cálculos na base da sua invenção, acabou por ser chamado também de louco. A sensibilidade, por mínima que seja, chegou a ser colocada na lista dos sintomas da loucura, por envolver delírios apaixonados e a recriaçãoo fantástica do real: o sur-real!

Eis que por alguma ironia desconhecida, somente as ironias são conhecidas. Parte da história é omitida e o sucesso, então, da maneira como é conhecido, é ser fodido (não me pergunte como). De fato, muitos artistas morreram na sargeta, ou por não administrarem bem o seu sucesso ou por algum vínculo político pouco saudável, mas nesse caso houve ascensão e queda.

Existem também os artistas anônimos nas noites metropolitanas e aqueles que jamais apareceram na lista dos televisionados e das celebridades. Nesses casos a confusão ocorre porque, por um fenômeno um pouco estranho para quem o passa a notar, a TV e os veículos voltados para as massas passaram a ser confundidos com a verdade para a qual conspira o mundo.

Diferentemente do que transparecem, tais veículos são dirigidos e editados normalmente por profissionais convictos do que querem. Parte deles declaram suas ideologias para mantê-las em diálogo com as de seu público, aprimorando-se e possibilitando que o público se aprimore. Outra parte, na pretensão de que todo um emaranhado de personagens políticas conservadoras os adulem e os façam influentes, oferecem seu retrato bem bolado com cara de espontêneo para que legiões de leitores o imitem. São mantidos estes, dessa maneira, afastados de sua maior arma: o pensamento.

Por alguns artifícios da mídia, somados a crueldades sociais e discriminações que por toda história fizeram vítimas no campo do sensível, a arte que se conhece hoje é aquela feita há quase um século. O caso se complica ainda mais com a relativização que poucos leigos conhecem, uma ruptura em todos os sistemas artísticos, que deu margem à transversalidade entre esses e outros, à transdisciplinaridade, bem como à dissolução da idéia de arte.

Para ser artista, em breve, poderá bastar viver. Não viver inerte como um telespectador, mas tão ativo quanto um louco: tanto cientista quanto apaixonado. Isso sim é obter sucesso!

quarta-feira, janeiro 21, 2004

teste hum : concluído
falhas no teste dois : provedor.

sexta-feira, janeiro 16, 2004

GERÚNDIO -> ...




* * * * *




O romance desvanece por ser romântico.
Aspira a seta em flama a rasgar a si mesmo,
Chama baixo e surdo para ser a chama
Segredada entre solidões periclitantes.

Não é forma, não tem matéria. Não é.
Não é senão essa razão desconsertante
Que, sem intento de alcançar, 'inda reclama:
"Tuberculose, que me aflige amar na cama".




* * * * *




A partir de hoje novas pequenas mudanças terão início nesse blog. Imperdível!

domingo, janeiro 04, 2004

Impressionante, Cassandra!!!



Hoje acordei e fiquei puto em seguida, meu pescoço está duro e dolorido, é um torcicolo do lado direito, mas eu ainda acredito. Você acredita? Um abraço para aqueles que acreditam.

VIVA O PAC-MAN!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

"Caia nessa água, venha se molhar", porque "quem acredita sempre alcança". "Você tem fome de quê?".

sexta-feira, janeiro 02, 2004

Contraste simultâneo

Do carvão nasceu a cor,
e quem dá valor à pintura
vê intensidade e temperatura
em Luiz Áquila, feito da luz
que o Carvão com pincel fabricou.

__________________________________


Veja Daniel Senise no Tribunal de Contas da União e seja feliz por alguns segundos.

Viva a geração 80
viva o Atari
viva o Chaves
viva o Jaspion!

Antes eu dou vivas, depois paro pra pensar (ouvir). Somos o avanço máximo de tudo o que os "rebeldes" oprimidos sonharam. Que liberdade de merda que eles conseguiram! Que cavalo de batalha escroto esse discurso de "eu sofri pra você jogar minha luta fora"!

Eu nasci em 1980 e amo meu tempo, porque vivo aqui e não ignoro a puta que me pariu. E a gente nasceu da mesma, magnífica, (...(..(.(( liberdade é o caralho na puta!!!)).)..)...).

Ter levado cacetada não é cultura...

Mas tudo bem, eu entendo quem disser que eu tenho que me revoltar e tomar o espaço público de volta. Eu entendo quem disser que naquele tempo havia intelectuais e que eles se reuniam fora do poder instituído e que hoje deveria haver essa mesma prática. Entendo que os intelectuais sempre foram uns chatos e que quando se juntam com os artistas acabam querendo "parar as rotativas" (expressão de DINES) e fazendo bossa nova ainda hoje. Entendo que também tenho essa vontade e essa falta de raciocínio. Entendo que não há sequer a enésima chance de se comparar a violéncia desses anos 00 à dos últimos anos 60 e 70. Entendo que os nossos velhos e mestres se borrem quando ouvem falar no Figueiredo, por não saberem se ele foi um militar temido aliado da ditadura, ou uma personagem louvável da Anistia. Entendo que se gabem por levar porrada, enquanto nós, de 1980, temos que nos cuidar contra DORT e LER. Mas entendo também que o que Eles (os "deuses" que nos antecederam) querem é impossível. Subverter o quê? No entanto, continuamos sendo vigiados, o espaço público continua sendo invadido sem respeito ao povo. Além do mais, nossa política é coronelista, nosso Estado é praticamente uma mega-empresa familiar emperrada cheia de bichos papões e bons-vizinhos querendo dançar uma valsa com a nossa irmã mais gostosa e comer a nossa tia velha rica. A qualidade que se exige é aquela que favorece quem está no poder. Entremos na Secretaria de Cultura no governo Roriz e lá está a gangue do Roriz, entremos em outro governo (cadê o outro governo?), ou no que já teve de diferente, e lá estará a gangue do outro governo... O que mais deve doer para nossos velhos (e amados) antecessores é que diante disso, eles e nós parecemos ter brochado de maneira incurável. Mas alguns, deles e nossos, querem outra vez aquele passado, aquela angústia - só em meio a ela se pode ser subversivo da mesma forma -, outros querem pensar e sentir, querem uma "poética do banal" e...

Ah! Esqueça tudo isso. O que eu quero dizer mesmo é que comprei um celular.
Pronto, chega de sofrimento.

Arquivo do blog