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allan de lana

sábado, fevereiro 28, 2004

(foto)grafias
Na semana passada, falávamos dos livros empoeirados não lidos, acumulados em nossas estantes. Antes ainda, falávamos de "andarilha, criatura" andarilhando em auto-reverberações incessantes. Na semana trespassada, o assunto era a humanidade do artista, seu mundanismo laico, limitado e normal. Esses temas podem confluir muito apropriadamente para a abordagem filosófica da fotografia. E essa confluência é especial nesse momento em que surge um novo grupo voltado à fotografia, ao seu estudo, principalmente, voltado à pesquisa e produção independentes.

Temos, no próprio blog, uma das variáveis conversíveis em favor de ações que se pretendem independentes. Essa mídia é, talvez, a menos obliterada de todo o planeta. Esse eaudeparfum aqui, por exemplo, se tornou praticamente um periódico onde o autor publica o que quer. Realizando o trabalho também do Editor, seleciona para publicar, desde o início do veículo, textos segundo seu próprio critério.

Não que essa liberdade deva prevalescer em toda imprensa. Isso seria um jogo sujo contra a qualidade. Mas há o que se aprender com esse tipo de veículo de comunicação. Justamente pelo aspecto pouco profissional, ele revela um quê de despreocupação. Não há ações a perder, nem patrocinadores a espantar. E nisso (no contrário disso, precisamente) também reside o pouco profissionalismo de, por exemplo, jornais patrocinados pelo governo e por algumas empresas tradicionalistas.

O jornal é, por excelência, o veículo da instabilidade, e a ele seguem-se todos os outros periódicos, em menor grau voláteis. A falta de profissionalismo está, apesar da credencial dos jornalistas e da sua inquestionável dedicação e competência, na seleção do editor e na coordenação do veículo com fatias do poder de barganha ou político. Atrelar-se ao capital ou a governantes é entrar em sua lógica. Para essa lógica apenas há fatias, direitas, esquerdas, e aquelas diferentes desprezíveis que, se não entram nas matérias positivistas, também não aparecem nas críticas, espaço reservado à esquerda. Portanto, boa parte do conhecimento produzido e das ações possíveis que poderiam ser mostrados permanecem ocultos. A taxada esquerda vai, por sua vez, sendo tratada como malévola.

Essa possibilidade de abertura, se tem sido de certa forma subaproveitada pela imprensa, teve sua grande chance com um outro invento moderníssimo. A fotografia tem entre suas características desde os primórdios uma afinidade com o mundo externo. O ato fotográfico, como o artista em seu prosaismo, está intimamente associado às coisas circundantes. Ele recorta fatias e fragmenta a imensidão de possibilidades visionárias. Nisso reside a instauração de uma comunicação fértil.

Inevitavelmente, associa-se o ato fotográfico à linguagem, reverberante, como uma criatura andarilha, impossibilitada de simbolizar o todo, afeita mais aos significantes do que à coisa em si. As ambições de chegar a um todo convivem também com a fragmentação necessária à existência dessas ambições mesmas. Tenhamos, talvez, a impressão de evolução, que por sua vez não passa de acaso motivado pela nossa própria condição subjetiva. Não podemos senão conhecer vestígios do mundo presente ou passado.

Este é o lugar de um livro ou uma foto. O estilhaço. Ambos são pensamentos em processo e pós-processo. Ambos evidenciam a impossibilidade e a ausência. Nem um nem outro são a realidade, por mais realistas que aparentem. No momento em que escrevo essa palavra, infinitas outras deixam de ser usadas. E o melhor parece ser cometer esse assassinato, ou anonimato. É o que fazemos, severamente, talvez acreditando em algum flanco, ou fenda, ("riss", para Kant), ou ocultamento, "lichtung" (Heidegger), para o nascimento de um "Unverbogenheit", a reverberação da linguagem (Foucaultiana) em termos Heideggerianos. Essa perspicácia nos permite subjetivamente situar em meio à diversidade. E eis o sentido de ancorarmo-nos por nós mesmos, que é o sentido do ato fotográfico, literário, ou criador de modo geral: "Melhor um livro na mão do que dois mofando".

Esse é o princípio do grupo de fotografia que está sendo criado. O princípio da independência e da diversidade, fragmentário, que se podem combinar de infinitas maneiras. Convido todos os meus leitores que tenham algum interesse em pensar tendo a fotografia como auxílio ou parceira e a discutir toda essa imensidão possível em seu prório ato, seja de escrever ou produzir objetos de arte. Convido-os a integrar o grupo grafias. Vocês podem me contatar no e-mail à direita e acima, logo abaixo da imagem da pintura, para pedirem o projeto do grupo. Para associarem-se à lista de discussão, basta enviar e-mail em branco para grafias-subscribe@yahoogrupos.com.br. Para acessar a página do grupo após associados, usem o endereço http://br.groups.yahoo.com/group/grafias/. Quem tiver meu telefone, pode me ligar a qualquer hora.

Para dirimir a curiosidade sobre a marca, explico-a. O conceito de diversidade de caminhos tomados pelos diferentes componentes e coesistência harmônica entre os mais variegados conteúdos foi expresso na escolha do nome grafias, no plural, em letras minúsculas. A divisão do subtítulo do grupo na lista de discussão (foto)grafias, sugere essa diversidade sendo abordada apartir de um procedimento análogo ao da escrita com a luz. Ficam em aberto as problemáticas que a mídia, a técnica ou o processo suscitariam, bem como as formas de abordagem do tema.

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