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Minha foto
allan de lana

sexta-feira, outubro 31, 2003

Saco cheio

Abelhas e zangões,
eu vos apresento
os meus hexágonos.

Usados em módulos,
protegem-vos do vento.

Senhoras e senhores,
eu vos apresento
casas para seus ferrões.

Podem ser colméias
ou então caixas de vespa.
Trancais-vos nelas,

não saís mais.
Mais amargas do que gengibre
são as desilusões.



Passo de carangueijo

Quem se amarra na cara amarrada
da gambiarra?

Quê se vela na cara-faixada
da Esplanada?

Quem não fita estar entre o Plano
e a palafita?

segunda-feira, outubro 27, 2003

Livre! (Cruz e Sousa)

Livre! Ser livre da materia escrava,
Arrancar os grilhões que nos flagelam
E livre, penetrar nos Dons que selam
A alma e lhe emprestam toda a etérea lava.

Livre da humana, da terrestre bava
Dos corações daninhos que regelam
Quando os nossos sentidos se rebelam
Contra a Infâmia bifronte que deprava.

Livre! bem livre para andar mais puro,
Mais junto à Natureza e mais seguro
Do seu amor, de todas as justiças.

Livre! para sentir a Natureza,
Para gozar, na universal Grandeza,
Fecundas e arcangélicas preguiças.




019 (eu)


Se o Greenpeace fosse simbolista,
Eu seria bucólico para resultar ativista.

O meu grilhão seria só a terra.
À sombra para ler faria justiça.

À imagem de Vera Cruz antes de vera,
Pindorama, a minha paz seria fera

Para ler João de Cruz e Sousa livre
Sob o Mogno, o Jatobá e a Aroeira.

sábado, outubro 25, 2003

As próximas exposições do CCBB vão contar com a "Poesia de Gambiarra" de Emmanuel Nassar.

A exposição está sendo trazida do Rio de janeiro. Dentre as obras, Nassar parece gostar muito de falar em Recepcor, por ser o seu primeiro investimento em abordar a cor como elemento formal. Recepcor é um mecanismo-artista, logo, se assemelha ao próprio Nassar. Nassar não recebe o mundo sem sua própria semelhança sensorial. O artista (em geral), que tem um quê de homo ludens, sente e traduz em matéria ou, como salientou Tadeu Chiarelli quando escrevia sobre Leonilson, tem liberdade de traduzir sentindo e sentir traduzindo. O ato artístico é um pensamento (inconcluso).
Talvez alguém pergunte sobre a Arte Pop de Nassar. Ligia Canongia o compara aos Estado-Unidenses, a Jasper Johns, por exemplo. O brasileiro trabalha com emblemas e bandeiras do Estado do Pará. E é justo nelas que também se mostram as diferenças. Possamos cruzar Canongia com Chiarelli:
1) Nassar é sujeito de um mundo cheio de frestas entre a matéria trabalhada e envernizada (pop) e a matéria originária (o barro, a floresta ...), não lhe é possível mostrá-la superficialmente, porque ela mesma é em profundidade;
2) Nassar nos mostra um "pop" de gambiarra e denuncia, por meio de Recepcor, que o artista transforma o mundo para si, pensa com a matéria. "E" - "N": a obra é também o próprio artista.
3) Nassar denuncia o Leonilson da cultura paraense, o povo que pensa com a matéria, que, ao construir sua palafita, pensa sua moradia por si mesmo. Na obra afirma-se o autor, assim como a forma de vida torna-se componente da nacionalidade.

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volta à semana passada
Sobre a fotografia eu quis dizer que não é a realidade, mas é uma técnica.

segunda-feira, outubro 13, 2003

Às vezes eu digo para mim mesmo: "Não pare, não desista. Some-se: aos novos e aos velhos". Mas, comumente, que desânimo... eu, que pensava que não tinha expressão facial nem vocal, que achava que provavelmente minha forma de ver o mundo fosse a mais morna possível, que eu fosse comparavelmente aos outros um insensível, vejo as pessoas se deixarem levar pelos discursos de verdade que vêm dos céus políticos mais altos. Isso é ser morno, dizer: "Eh! Agora deixa, já era, vamos viver com mais esse prejuizo, a gente acostuma.". E como eu disse ao Alex Frutuoso, meu velho irmão que gosta de ler isso aqui às vezes, não acredito que alguém possa ser "pan" (todo, nem tudo), porque o todo é um bando de cacos, de indivíduos que se invalidam e incapacitam de pensarem o novo, o que virá e o que está aí.




Ver pessoas desistindo
É péssimo.

Às vezes você me pergunta,
quando estou tentando mudar o destino,

o que é que eu, no meu grande aparente niilismo,
escolho como valor-paróxido

e percebo que, como você,
ainda não escolhi nada.

Mas você desistiu,
enquanto eu continuo decididamente desesperado.




mas um descanso é bom também
Sonhar com o Festival de Arte de Goiás Velho... Isso não faz mal. Eu amo os meus amigos (lembrando a falecida "Beto Só e os Solitários Incríveis", a eis melhor banda de roque de Brasília) e nós vamos; sim, vamos. Adeus.

Antes, só mais uma coisa, aos fotógrafos (seguindo minha tendência esquisita e fragmentada): fotografia não é realidade e técnica não pode ser tomada por arte. (Onde está o fio da meada disso tudo?).

quinta-feira, outubro 09, 2003

Que sono.
Não sei se você notou, mas resumi o texto da direita.


Arte maior

Arte mata.
O atentado é arte.

Arte sufoca.
A pena de morte é arte.

Arte corrompe.
A avareza é arte.

Arte emburrece.
O ensino médio é arte.

Arte aliena.
A Universidade é arte.

Arte complica.
A burocracia é arte.

Arte paraliza.
O serviço público é arte.

Arte não funciona.
O idealismo é a arte.

Instrução:
Contar histórias (de simples a complexas) sem concluir, sem reduzir, sem seguir por atalhos. Contá-las na íntegra segundo o que sabemos delas, usando todos os dados que para nós foram relevantes.



Quanta inteligência esconde
A selvagem quinta-essência das formigas?

Palpar o Ser será possível
Desligadas do (do)Ente verbal-cognoscível?

Estão lá na obra doce
E são visualmente significantes.

São o gênio em fruição
Do qual minha razão está distante:

Contemplação,
Com a qual se faz ausente.

terça-feira, outubro 07, 2003

O punk-rock é uma boa forma de meditação.

Hoje é dia da minha cisão mental temporária. Semana que vem meu cérebro (talvez) estará menos descontínuo. Aproveite.

Você quer entrar ou sair?
Um dos motivos do meu sono e da minha insônia é a vontade enorme de queimar todos os meus pertences: isso ocupa minha mente à noite. E a noite de hoje em dia é preocupante, por ser uma mãe no esquecimento.

016
A solidão é uma flecha
na noite de cupido.

A conjunção o humaniza
e denomina. Generosamente.

domingo, outubro 05, 2003

Eu, Você, Nós.

Visitação na Galeria da UnB (406 norte).

Eu. Cinco caixas pretas sobre pedestais. Quatro chaves em suas fechaduras. Caixa a caixa ou chave a chave se busca a combinação certa entre chave e fechadura. A subtração do corpo essencializa sua composição. Ao invés da "Vênus de Gavetas", somente as gavetas e o conteúdo: sangue, água, carne, ar. E a quinta caixa? Inacessível por meio das quatro chaves: gaveta a que só a própria vênus tem acesso. A autora (que é a Mariana Pagotto e, como diria Mário Pedrosa, é minha amiga) caiu na obra e, portanto, fala de si. O "eu" está expresso naquilo a que não se tem acesso.

Você. O fechamento escuro, misterioso, do "eu" é revertido. O local da morte está isolado pela fita da perícia: no chão, um desenho a giz da silhueta do falecido; na parede uma foto de parte de seu tórax e abdome o esconde mais do que o revela. Ao lado, pertences do falecido e registros policiais e médicos da situação, causa da morte e atestado de óbito. Cada objeto remete a situações e hábitos daquele a quem não conhecemos. O "você" é revelado sobretudo por seu percurso vivido. O evento e a própria galeria entraram para a condição de você. Na abertura, a obra teve um impacto que não será mais recuperado: a mesma data da vernissage e do registro de óbito, um dia depois da morte por desidratação. Por acaso o Matias (que é muito inteligente, perspicaz e - de novo o Mário - é meu amigo), encontrou uma cobrança da CAESB para que a UnB pagasse sua conta d'água. Não hesitou, emoldurou-a e a colocou nos pertences do falecido. Esse ato revela (ou reforça) uma minúcia sedutora e uma discussão sobre a raiz do próprio trabalho de ordenação empreendido pelo artista (que ilude), minúcia também revelada pelo acaso não-acaso das molduras desalinhadas propositalmente. A aura do "você", para quem sabe da cobrança da CAESB, se torna um misto do você anterior com a instituição. Quem quiser saber mais, visite a exposição, o "você" tem muito mais a dizer. Interessante compará-lo com o "eu", para quem o acesso à diferença é vedado: em "você", toda a matéria protetora do "eu" perdeu sua função e a aura dos pertences é o indício das particularidades, ao mesmo tempo que nos deparamos com indícios de que aquele outro indício aparentemente espontâneo teve seu aparecimento forjado. Há, logo, uma dupla sinceridade, e uma delas é forjada.

Nós. Objeto auto-simbólico, feito com tiras de pano multicolores unidas por nós formando uma massa unida erguida por um gancho, dependurado no teto. Na parte de baixo dela, outro gancho une à massa fortemente escultórica panos soltos, não tensionados. Sua simplicidade funciona como se materializasse subrepticiamente um pensamento abstrato. Não há o diálogo conceitual intenso presente nas outras duas obras. Raimundo Kamir, que é meu amigo, opta por uma expressão individual e mantém diálogo com os panos usados na vernissage para forrar a mesa de comes e bebes e criar situações de convivência sobre a grama do lado de fora da galeria. O "nós" é uma praxis.

sábado, outubro 04, 2003

Sem
.

Coágulo cósmico
em giro atrofiado
na memória.
.

Anti
.

Mundo
Mundo
Mundo
.

Onde está minha terra,
minha juventude,
meu conhecimento?
.

PAUSE
.

STILL
!

sexta-feira, outubro 03, 2003

Como é bom cansar compartilhado,
ser inútil em grupo
e dizer quem sou eu
dizendo quem somos nós.

Um prazer, ser inútil,
mas tanto, que nem um salário
de um milhão pague tanta
inutilidade.

Melhor do que ser inútil
é ser sendo,
mas ser sem vencimento.
Quero dormir, mas antes,

ser louco a ponto de sorrir
e gostar de fazer você feliz,
nem que tenha que gritar
para os calculistas:

- FIM!!!

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